E está chegando o dia de dar adeus a Auckland e rumar para o sul.
Hora de fazer um apanhado dessa primeira amiga que nos acolheu. O que aprendemos? O que é diferente (sempre vou evitar usar as palavras melhor ou pior)?
Sempre imaginei que um invento fantástico para viajantes seria um “congelador de impressões”, ou seja, uma máquina maluca que pudesse congelar todas nossas sensações e impressões em determinado momento de nossa vida. Assim, como um rascunho de um desenho ou de um texto em desenvolvimento, poderíamos “voltar ao passado” e revisitar nossas emoções em várias etapas de uma viagem. Digo isso pois acho que todos nós (uns mais outros menos) temos a tendência de nos adaptar às diferentes condições e o novo passa a ser velho rapidamente. Uma coisa que foi uma grande surpresa no início passa a ser lugar comum e nosso olhar não capta mais. Nos acostumamos. É mais ou menos o que a expressão inglesa “take it for granted” quer dizer. Na verdade, dependendo do referencial, isto pode ser bom ou ruim.
Já chegando ao fim dos nossos 20 dias em Auckland, tenho essa sensação. Tanta coisa que nos chamou bastante atenção e agora já estamos “taking it for granted“, mesmo com tão pouco tempo por aqui. Vou tentar usar meu “congelador de impressões” e listar algumas coisas que achei mais interessante por aqui.
Como estamos em uma casa “normal” alugada pelo AirBnb e não em hotéis que normalmente são localizados nas zonas turísticas, foi um certo choque quando vimos que o supermercado mais próximo ficava a uns 10 quarteirões de distância. Já deu para perceber que, sem carro, e tendo que preparar pelo menos o café da manhã e uma refeição por dia, isso foi um stress no início. Dez quarteirões a pé para comprar comida e produtos de limpeza!
E não é que nos adaptamos? Hoje, é absolutamente natural para nós, quando estamos passeando pela cidade, notar um supermercado (a rede mais comum aqui se chama Countdown) e aproveitar a deixa e comprar algumas coisas para sobrevivência básica. Entramos felizes e contentes e saímos com nossas sacolinhas antes de voltar para a nossa casa. A Celina até me apelidou de “tarado do Countdown” pois não posso ver uma filial do supermercado e fico logo com vontade de entrar para comprar as coisas que estão faltando. Pequenas mudanças, mas mudanças…
Outra coisa que estranhei em Auckland é como o transporte público é deficiente. Só tem ônibus e trem. Não tem metrô (por causa do medo dos terremotos/vulcões?). Os ônibus andam, na maioria das vezes, bem vazios e não passam com tanta frequência. É muito comum termos que esperar 15 minutos para chegar nosso ônibus. Isso também passa a ser absolutamente natural para nós.
A consciência alimentar dos Aucklanders é outra coisa que me chamou bastante atenção. Nos supermercados são poucas as comidas processadas e enlatadas. Muita ênfase na alimentação saudável (que é muito mais cara, inclusive aqui). Nos cardápios dos restaurantes é super fácil achar opções sem fritura, integral, sem glúten, vegetariana, vegana e afins. O menu vem cheio de símbolos que consultamos antes de comer. Eu brinco que quem gosta de comer glúten aqui tem muita dificuldade!
Parques, ah, os parques. Tem verde em todo o canto e é super natural as pessoas saírem do trabalho (e nos fins de semana) e rumarem para os parques para praticar seus esportes favoritos (rugby, cricket e, em um longínquo terceiro lugar, futebol) ou simplesmente caminhar e fazer picnic. Está sendo programa de vários dias para nós.
Vulcões, oh, os vulcões. Já disse que Auckland está cercada por nada menos que 48 vulcões (li algumas estatísticas que consideram 53, mas não importa, pois qualquer que seja o número é vulcão que não acaba mais). Vulcões ativos, é bom frisar. A última erupção foi há uns 600 anos atrás, assim a cidade não tem nenhum trauma sobre os mesmos e a ideia de estar no meio desse caldeirão parece que é bem assimilada pela população. Um ótimo exemplo foi quando estávamos em Mount Eden (um local lindo com uma vista estupenda, bem perto do centro da cidade, que naturalmente é um vulcão) e vimos um pai passear com seu filho bem pequeno, no carrinho, que olhou para baixo (em direção à cratera) e disse “volcano, volcano“. O pai respondeu simplesmente “yes son, we are in a volcano”. Ou seja, a coisa mais óbvia e natural do mundo até para uma criança de 2 anos.
É importante dizer que os vulcões de Auckland não são aqueles vulcões que logo imaginamos com um cratera enorme com lava dentro e fumaças tóxicas saindo do seu interior. Todos que nós vimos são, embora ativos, crateras fechadas, normalmente com um gramado lindo e um parque ao redor. Diga-se também que alguns deles são submarinos.
De qualquer maneira, existe um forte plano de contingência para um big one que pode atingir a cidade. Olha só o vídeo abaixo, do museu de Auckland, que tenta reproduzir o que seria uma erupção na cidade.
Finalmente, a questão da ligação da cidade com o mar e os barcos. Existem um sem número de praias bonitas e marinas ao redor da cidade. A estatística mais aceita diz que a cada três famílias, uma tem um barco. É, de longe, a maior taxa do mundo. A foto abaixo (feita no nosso bairro que está razoavelmente distante do mar) ilustra bem o que vemos por aqui. Bem comum encontrar barcos estacionados na rua e dentro de garagens.
Várias outras pequenas curiosidades poderiam ser listadas aqui como o fato que na maioria dos restaurantes você vai até o caixa para pagar e diz qual é sua mesa. Relativamente incomum os garçons trazerem a conta!
Como sentimento geral, fica a sensação que fomos muito bem recebidos e já vemos Auckland como uma velha amiga a que certamente retornaremos um dia para tomar um café e contar as novidades (apesar da influência inglesa, a cultura dos cafés, e não do chá, é fortíssima. Cada coffee shop tem uns menus super sofisticados e diferentes. Os locais adoram).
Semana que vem, rumo a Christchurch na ilha do sul!
10 comentários sobre “Temos que falar sobre Auckland”
Comments are closed.
Estou atrasado nas leituras, mas não estou pulando nenhuma.
Difícil admitir, mas o textos estão muito bem escritos, inclusive os do Tacu!
🙂
Velho, e não é que acharam o que fazer em 20 dias aí? Rs rs. O tempo é realmente relativo, e como diria um grande conterrâneo da Boa Terra: “o melhor lugar do mundo é aqui, e agora”. Aproveitem!
Totalmente verdade. O dia tem 24 horas para todos, mas é um dos conceitos mais relativos que existem. Ficamos 20 dias aqui, mas conhecemos apenas uma fração do que poderia ser possível. Ao mesmo tempo, quando falamos para locais que estamos esse tempo todo aqui, eles também ficam surpresos. 20 dias em Auckland? O que tem para fazer estes dias todos?
Marcelo, você tarado por um supermercado?!?!?! Quem diria… rsrsrs Primeira parada da viagem e já uma evolução e tanto!
Quanto ao congelador de impressões, acho que é por isso que gosto tanto de fotografia. Revendo fotos antigas, consigo reviver bastante daqueles momentos cujas imagens foram congeladas…
Bem, muito legal estar “viajando” com vocês pelo blog. Beijos.
“tarado” por necessidade. Não por gosto. Não exageremos rsrs.
Estou adorando acompanhá-los. Realmente vocês estão me levando a outro mundo, bem distante de tudo o que vem acontecendo por aqui e em outros lugares, onde a coisa anda preta! Obrigado por mostrar que ainda existe paz no mundo! Curtam mesmo, muito! bjs
Obrigado, Márcia. Fico feliz de você estar gostando. A ideia é contar um pouco do que estamos fazendo e das experiências e impressões que estamos tendo para trazer as pessoas para perto de nós e diminuir as saudades inevitáveis.
Sim, existem outros mundos (e talvez nem precise viajar para encontrá-los) e temos que estar sempre atentos a eles. Ver de outra forma, outra abordagem. No nosso caso, escolhemos a viagem como um meio de desenvolver novas habilidades fazendo algo que nos dá um prazer intrínseco.
Tacu; adorei a ideia do congelador de impressões! Como a 1a marca das vivências! A memória faz um pouco esse papel, mas creio que até para ficarmos confortáveis, vamos desenvolvendo familiaridade com o que antes era desconhecido, que já não nos sobressalta mais. Coisa de adaptação…
Pois é, Cláudia. A capacidade de adaptação e lembrança tem os dois lados dependendo da situação. Nós estamos tentando optar pela parte boa 🙂