Muita gente pensa que viagem de longo prazo é que nem férias, só que com duração maior. Seria ótimo, mas dificilmente é assim que as coisas funcionam.
Quando saímos de férias queremos viver a mil, aproveitar ao máximo cada segundo. Numa viagem de longo prazo o ritmo é outro, slow travel. Não somos exatamente turistas, tampouco locais. Como o deslocamento frequente cansa muito e encarece a viagem, a tendência é ficarmos um período maior em cada cidade, mais abertos a participar de atividades que não encontrariam espaço num roteiro típico. Os passeios turísticos também têm vez, mas são intercalados com atividades corriqueiras como fazer compras, lavar roupas, ler, escrever, descansar, cozinhar.
Por falar nisso, comer fora é uma delícia e temos experimentado muita coisa gostosa, mas todo dia acaba cansando. E engorda! Se numa viagem de férias de duas semanas costumo engordar uns 2 ou 3 quilos, imagina o efeito potencialmente catastrófico de vários meses na estrada neste pique. 😝
É recomendável não sucumbir a todas as tentações calóricas, fazer algumas refeições em casa (seja lá onde isso for) e comer frutas e verduras, mas dependendo do lugar não é tão fácil conseguir alimentos frescos. Manter hábitos alimentares (relativamente) saudáveis viajando demanda muito esforço e convicção. Bem, vamos tentando. Até agora minhas roupas ainda estão cabendo. 😉
Viajar é muito bacana e estamos tendo uma incrível oportunidade de conhecer lugares, culturas e pessoas muito interessantes.
Só que a longo prazo é também cansativo. Este tipo de viagem envolve sair da zona de conforto, se esforçar, superar, crescer. É uma oportunidade única e enriquecedora, mas tem horas que a saudade aperta, o diferente incomoda e o cansaço bate. No pain no gain.
Ainda bem que inventaram skype, whatsapp e facebook, para acalmar nosso coração.
Já completamos três meses de estrada. Estou sentindo que agora me pegou o tal do burnout, fadiga que costuma atingir viajantes lá para o terceiro/quarto mês. Já tinha lido sobre isso – normal, mais dia menos dia quase todo mundo se sente assim, é só pegar leve, descansar por uns dias, que o pique volta.
Para você ter uma ideia, eu estava assistindo ao desenho Divertidamente (Inside Out) no trajeto de Kuala Lumpur para Penang, na Malásia, e me emocionei com a cena em que a menininha diz como é difícil se mudar e ficar longe das pessoas e coisas de que gosta. Imagina. Foi até engraçado. Tive que fazer força para não pagar mico! 😝. Ah, a história tem final feliz: a menininha logo se adapta às mudanças e aproveita suas novas aventuras. 🙂
Depois das paradisíacas Nova Zelândia e Austrália, é um desafio se adaptar ao frenético Sudeste da Ásia. Enquanto aqueles países são primeiro mundo, beleza, organização, tranquilidade, conforto, estrutura e limpeza, na Ásia é que realmente começam as experiências de contraste, de apreciação do agitado, quente, populoso, diferente e exótico. É sair da zona de conforto mesmo.
“É preciso mudar o chip”, diz o Marcelo.
É bastante interessante notar as diferenças culturais, estilo de vida e hábitos. Uma simples ida ao banheiro pode ser uma experiência desafiadora caso a única opção disponível seja o squatting toilet (vaso rente ao chão, para usar na posição agachada).
Para piorar, a higiene é feita com uma ducha que deixa o chão alagado. 😝 Felizmente até agora ainda não tive que encarar.Na Malásia tem templo budista, hindu e mesquita para todo lado, inclusive lado a lado. Muitos lindíssimos, alegres e coloridos. O exótico por aqui é igreja cristã, mas vimos algumas também, por conta da influência britânica.
Nos templos e mesquitas não se pode entrar calçado, levando impurezas da rua para um local sagrado. Em alguns é necessário cobrir as pernas e, às vezes, até a cabeça. Nesses casos é comum emprestarem ou alugarem uma espécie de véu.
Para momentos assim tenho sempre minha supercanga polivalente na mochila.
Em Kuala Lumpur nos chamou atenção uma mulher de nicabe (roupa parecida com a burca, mas que deixa os olhos de fora), sentada ao lado de outra vestindo camiseta e shortinho bem curto. Isso é contraste! E elas nem pareciam incomodadas uma com a outra. Burca mesmo não é comum ver por aqui. O que tem mais é muçulmana usando apenas o véu na cabeça, com o rosto de fora. E tem véu de tudo que é cor e estampa, inclusive com carinha do Mickey. São vendidos em lojas de luxo e barraquinhas de rua.
Achamos curioso ver o conjunto véu + óculos escuros/chapéu, mas por que não?
Apesar de também haver bastante indiano e muçulmano em Penang, são os chineses que dominam a cidade. Como essas três culturas são muito diferentes, entre si e da brasileira, é importante manter a mente aberta, sem preconceitos.
Minha primeira impressão foi que chinês era mal-educado, falava alto, furava fila, empurrava. Pode até ser verdade em muitos casos, mas não se pode generalizar. Encontramos alguns chineses bem gentis também. Além disso, após um par de dias no meio desta multidão, entendi um pouco o lado deles. Continuo defensora de gentileza e cordialidade, mas passou pela minha cabeça que talvez eles sejam criados de forma entrona por questão de sobrevivência, para conseguir um lugarzinho ao sol no meio de tantas cabeças. As nossas noções de boas maneiras (ceder a vez, dar passagem, segurar a porta etc) não parecem encontrar muito espaço na realidade superpopulosa dos chineses.
Ter sensibilidade para enxergar as coisas também sob a perspectiva do outro. Lição do dia.
12 comentários sobre “E já se passaram 3 meses”
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Essa hora do burnout é muito braba. Tem que tentar mudar o pensamento com a meditação budista, pode ser que ajude. Todavia quando encontramos a privada no solo, ai, ai ,ai meu Deus, eu tenho verdadeiro horror, na Europa tem também e na América latina idem. Dizem que é a melhor posição, mas … sem palavras. Na estação de trem de Milão é assim.
Curta bastante amiga, mas se tiver que voltar, volte… estamos aqui, saudades bj
Valeu, Lis.
Este tal de burnout já passou. Tudo bem por aqui.
Saudades.
Bjs
Celina: um abraço para vocês dois!
Legal te encontrar por aqui.
Bj
Celina: estou com muitas saudades! Espero que aproveitem tantas novidades! Beijos!
Por aqui muitas saudades!!! ❤❤❤
Legal o aprendizado Cê. Nunca estive na Ásia, mas a sensação que tenho à distância é que os caras se tornaram mestres na arte de fazer muito com pouco, dado o excesso de gente. Sabe como é: “em terra de saci uma calça dá para 2″… 🙂 Confere isto por aí e nos diz se é realidade ou mito. Divirtam-se e aprendam muito. Beijos, Zéu
☺
Não conhecia este ditado, mas com certeza se aplica aqui.
Bjs
Oi Cê; é isso mesmo: é muito importante tentar ‘entrar na pele do outro’ , quase como se fosse possível enxergar com os olhos dele… Gostei da citação do Divertidamente! Animação cabeça! Pois tenho um desafio: tente se aproximar da produção cinematográfica e televisiva local. Vá de mente aberta! Você pode se surpreender…
Pelo que vi até agora, eles adoram programas locais de calouros ou culinária, parecidos com The X Factor e Master Chef. Não da para entender uma palavra, mas a dinâmica é igualzinha.
Oi Celina. Certa vez na Coréia era o primeiro da fila esperando o elevador, quando a porta abriu dei passagem para quem esta dentro sair, o pessoal que estava de fora avançou e entrou correndo. O elevador lotou e eu sobrei do lado de fora.
Considero que os coreanos em geral são bem gentis e educados, pelo menos os que convivi mais diretamente eram, mas concordo com você que em muitos casos não dá para transferir os padrões de educação da nossa cultura para as outras.
Vocês viveram essas diferenças bem de perto, né?
E aposto que nós também fazemos coisas que eles consideram falta de educação.