Nosso roteiro no sudeste asiático obedeceu basicamente ao critério geográfico. Países mais próximos, passagens mais baratas! A ordem Singapura, Malásia, Tailândia, Laos, Vietnã e Camboja é (muito) aproximadamente um círculo percorrido no sentido horário.
Assim, saindo da Tailândia, o destino mais óbvio era a cidade de Luang Prabang no norte do Laos. Antiga capital do país, é de longe a cidade mais turística do Laos. E tem motivos para isso!
Depois de 30 dias na Tailândia, seguindo o conceito de slow travel, mudamos um pouco o ritmo e passamos para o normal travel, ou seja, turismo tradicional de férias. Um dos motivos para reduzirmos nossa permanência lá é que esse é a única região de nossa viagem à Ásia com risco de malária e decidimos não tomar medicação preventiva (os efeitos colaterais podem ser bem fortes e já vamos tomar essa medicação na África). Fomos na época da seca e realmente a quantidade de mosquitos era muito baixa.
Como ficamos apenas uma semana no país, toda nossa programação foi bem “turística”. Isso me fez refletir bastante sobre a questão da indústria do turismo como um todo.
Eu li em algum lugar (teria que rechecar essa informação pois os números são conflitantes dependendo do site que se consulta) que o turismo já é a maior indústria do planeta em movimentação de dinheiro e empregos gerados.
Pegando Luang Prabang como um microcosmo da indústria do turismo, dá para entender um pouco do porquê disso. A cidade é patrimônio histórico e cultural da humanidade devido aos belíssimos templos e tradições budistas.
No entanto, existe uma linha muito tênue entre o turismo predatório e o turismo positivo. Três exemplos do Laos para exemplificar o argumento:
Turismo irresponsável: nós adoramos animais e a oportunidade de você ser “cuidador” de elefantes durante um dia é amplamente oferecida no Laos (e na Tailândia também). Você passa o dia alimentando os elefantes, passeando com eles e até entrando no rio para dar banho nos bichinhos (na verdade, bichões). Seria uma oportunidade brilhante para passar bons momentos e conseguir umas boas fotos. No entanto, pesquisamos mais o assunto e vimos que a maioria dos locais que promove este tipo de passeio tem uma reputação extremamente duvidosa em relação à maneira como trata os elefantes.
Já que ainda vamos para a África, onde a maioria dos parques nacionais (pelo menos nos países que vamos visitar) é um ótimo exemplo de manejo correto dos animais, foi o suficiente para que disséssemos um sonoro não para este tipo de turismo no Laos. Uma observação aqui é que existem sim operadores responsáveis que promovem passeios que respeitam os animais. Assim, não estou sugerindo aqui que é irresponsável passear com elefantes. Como eu disse, o importante é pesquisar antes. Normalmente, desconfie bastante dos passeios com um preço muito baixo.
Turismo “tô na dúvida”: possivelmente, a imagem mais divulgada de Luang Prabang é a cerimônia do Alms Offering. Já falei mais sobre como isso funciona neste post aqui. Em resumo é uma cerimônia em que os monges saem às ruas para pedir alimentos à população.
O negócio ficou tão mega e turístico em Luang Prabang que alguns problemas começaram a surgir. A população local vende os alimentos para os turistas e, para facilitar as coisas, coloca muitos alimentos industrializados no “pacote das oferendas”, como balas e biscoitos. Logicamente, os monges vão ter vários problemas se começarem a comer este tipo de comida ao invés do tradicional nutriente da região que é o arroz. Outra questão é que se perde um pouco (muito) da autenticidade da coisa. Parece mais um show de música que um ritual religioso.
O ponto positivo é que os monges no Laos nunca vão ter dificuldades para conseguir comida e, de uma certa forma, ajuda a divulgar a filosofia do budismo. Tô na dúvida! Curiosamente, esse ritual existe na Tailândia e lá não é tão “atração turística” como em Luang Prabang.
Turismo responsável: A cidade de Luang Prabang em si é muito agradável. A área histórica fica em uma península com o famoso rio Mekong passando ao lado. É bem limpa, no centro histórico, e tem centenas de ótimos restaurantes para comer. O mais bacana é ver vidas completamente transformadas com as oportunidades que a indústria do turismo trazem.
Um exemplo é o dono da pousada em que ficamos, um vietnamita humilde, com uma inegável visão de negócio, viu o grande potencial do local e arrendou uma casa para servir de pousada e hoje já é uma das hospedagens mais bem cotadas da cidade no Trip Advisor. Admirável nosso amigo Qúan. Exemplo de empreendedor com gigante força de vontade.
Outros exemplos são as centenas de jovens que conseguem um emprego nos restaurantes e lojas da cidade. Você sente o esforço que eles estão fazendo para aprender inglês e atender os turistas da melhor maneira possível. Aprender inglês (falarei sobre isso em um post futuro) é uma carta de alforria das péssimas condições em que muitos viviam principalmente nos vilarejos no interior do país, lembrando que o Laos ainda é um país majoritariamente rural.
Mais um exemplo sensacional é um biólogo que largou a vida confortável que tinha na Holanda e veio para o Laos trabalhar com sua paixão: borboletas! Abriu um pequeno parque dedicado a esses animais e, como agradecimento ao país que o acolheu, investiu em uma escola para as crianças locais.
Existem inúmeros exemplos iguais aos acima.
Em resumo, a nossa estadia no Laos foi o cliché dos “mixed feelings”. Uma semana não é nada para conhecer um país ainda mais ficando em uma cidade bastante turística como Luang Prabang. Como contado acima, vimos o feio e o bonito de situações como essa. No entanto, recomendamos sim o país. Cabe ao seu olhar deixar o bonito prevalecer sobre o feio. Lugar de extrema pobreza, mas com uma população muito simpática e com uma vontade enorme de construir um futuro melhor para todos.
Tem também o cenário lindíssimo. O Laos é o único país do sudeste asiático que não tem saída para o mar. Florestas e montanhas dominam a região. As cachoeiras de Kuang Si são umas das mais bonitas que já vimos no mundo e o passeio pelo rio Mekong é bem gostoso.
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Para finalizar, um dos casos mais engraçados que aconteceu conosco até agora. No dia da saída do país, pedimos transporte ao hotel para nos levar ao aeroporto. Entramos no carro e, para nossa surpresa, o motorista para em uma casa próxima e embarca, no banco do motorista, o que parecia ser um parente dele (irmão mais novo provavelmente). O detalhe é que nitidamente essa pessoa não sabia dirigir. Ou seja, o irmão mais velho estava aproveitando para dar aulas de direção ao irmão mais novo (não estávamos entendendo nada do laociano, mas essa foi nossa conclusão do papo). A cidade de Luang Prabang é bem pequena, o aeroporto bem próximo, e o cara não era um completo neófito na direção, mas que foi meio surreal foi. Coisas da Ásia!
2 comentários sobre “Que tal um pulinho no Laos?”
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Tacu, seu post é interessante, beira ao surreal… Já vi comprar comidas em parques para dar aos animais, elefantes, girafas, etc, mas dar para pessoas como um evento turístico é triste, perde totalmente o sentido.. Também surreal é a historia da aula de direção quando o motorista estava prestando um serviço, é assustador e engraçado ..
No mais, e de muito bom, as cachoeiras parecem lindíssimas , fiquei com muita vontade de conhecer !
Saudades, beijos
Pois é, Izabela. Acabou que Luang Prabang tinha muito mais coisa para fazer que pensávamos (e não para de crescer). É bem interessante mesmo.